A China e os têxteis II

“As decisões serão baseadas em factos para que as nossas acções tenham defesa”.

Peter Mandelson


Iremos na sequência do nosso anterior escrito de 5 passado, e depois de uma apreciação geral sobre o tema que tem preocupado a União Europeia (EU) e os Estados Unidos acerca da inundação dos produtos têxteis chineses, entrar numa apreciação um pouco mais detalhada sem cair no exagero do tecnicismo ou no academismo. Ainda que, o problema venha desde há algum tempo a agravar-se pela tomada de mercados para exportação por parte da República Popular da China, a EU decidiu readquirir em 24 de Março passado, o controlo sobre as exportações têxteis para o mercado comunitário, o que de outra forma as exportações da China poderiam ser objecto de restrições formais no que diz respeito à comercialização neste primeiro momento de alguns produtos têxteis, cerca de 9, tendo esse pedido de aplicação das chamadas “Medidas de Salvaguarda” imediata por parte da Comissão Europeia, que referimos ainda que superficialmente, partido da França, Itália, Grécia e Espanha, como sendo aqueles que maior prejuízos sofreriam. Como sabemos, em 1 de Janeiro, foi posto termo ao regime de quotas mundial por parte da Organização Mundial de Comércio (OMC), pelo que a partir dessa data o aumento das exportações chinesas sobiu significativamente e em alguns casos particulares de forma alarmante, chegando a atingir para certos bens um aumento de 500%. O Protocolo de Adesão da República Popular da China à OMC, na qual se torna Membro em 11 de Dezembro de 2001, contém os termos da sua entrada na OMC, em que aquela aceitou que membros integrantes da Organização Multilateral, limitassem as importações dos seus têxteis até um máximo de 7,5% acima do nível de desembarque do ano anterior, e até 2008. Entre as modalidades e condições da adesão, o Artigo 242º. do Relatório do Grupo de Trabalho, que faz parte integrante do Protocolo de Adesão da China à OMC, prevê uma cláusula de salvaguarda específica, aplicável até 31de Dezembro de 2008, relativa às importações para um país membro da OMC de produtos têxteis e de vestuário originários da China e abrangidos pelo Acordo sobre os Têxteis e Vestuário (ATV) e que vem publicado no Regulamento (CE) Nº. 138/2003 do Conselho, de 21 de Janeiro de 2003 que alterou o Regulamento (CEE) Nº. 3030/93, relativo ao regime comum aplicável às importações de certos produtos têxteis originários de países terceiros, nos Artigos 9º. e 10º, podendo no aditado Artigo 10º.-A ser aplicadas “Medidas de Salvaguarda Especiais para a China” que analisaremos a seu tempo.

A China produziu 17% cento dos produtos têxteis do mundo em 2003, mas a OMC prevê que em três anos as exportações chinesas para o mercado mundial irão aumentar acima de 50%. Perante tal situação e dada a iniciativa desses quatro países a UE não podia deixar de tomar uma posição e ficar impávida e serena a assistir ao desenrolar dos acontecimentos, pelo que ainda que não o tendo invocado expressamente o Artigo 10º-A. mencionado, não lhe restava outra alternativa que não fosse tomar uma medida. Nessa conformidade o Comissário europeu para o comércio, Peter Mandelson, que substituiu Pascal Lamy, do executivo de Romano Prodi, e que desde Dezembro de 2004 é o novo Director-Geral da OMC, decidiu fazer uma avaliação ou controle de nove categorias de produtos têxteis chineses. Após o estudo e elaboração do respectivo relatório, poderá a EU, tomar medidas que impliquem restrições à entrada ou importação de produtos chineses nos 25 Estados-membros da UE. As investigações decididas pelo Comissário europeu para o comércio baseiam-se essencialmente sobre os ditos nove produtos, entre eles figurando as importações de camisas, calças para homem, blusas, meias, casacos para senhora, entre outros.

Os dados estatísticos apresentados pela Comissão Europeia, mostram que a UE importou 95,7 milhões de camisas para homem nos primeiros três meses do corrente ano, representando um aumento de 164% em relação ao mesmo período de 2004. A China impôs tarifas à exportação em alguns produtos desde 1 de Janeiro, mas no entender da Comissão Europeia, essa medida não é suficiente. A imposição tarifária chinesa tem em vista precisamente evitar a aplicação das ditas “Medidas de Salvaguarda". Apesar dos quatro Estados-membros referidos apelarem à sua aplicação imediata, tendo por argumento, que os seus produtores sofrem a concorrência imbatível da China, em virtude desta possuir mão-de-obra barata e subsídios oficiais, entre outras vantagens. Perante esta situação em 26 do mês passado, a China reagiu contra as possíveis medidas proteccionistas da UE às importações dos seus produtos têxteis, que considerou uma tentativa inútil de reforçar o sector têxtil da EU, tendo o governo e a indústria têxtil chinesa criticado com dureza o início da investigação acerca da avaliação do possível impacto das suas importações de têxteis, tendo em vista impor medidas que protejam o mercado da EU, afirmando que a UE deveria concentrar a sua atenção em defender os interesses dos europeus e tratar com prudência o assunto das limitações, que são um obstáculo ao comércio,

A indústria chinesa afirmou que medidas proteccionistas, a serem aplicadas, não iriam reforçar o débil sector têxtil da UE, e que a possível implementação de medidas de protecção contra os têxteis chineses, violaria o Artigo 242º. do Protocolo de Adesão da China à OMC, no que diz respeito ao princípio da livre troca e comércio justo (fair). Os representantes do comércio chineses acusaram a Comissão Europeia de abuso do direito de julgamento e opinião, ao iniciar de forma unilateral as investigações sobre as nove categorias de produtos chineses, abrindo caminho à imposição de limitações quantitativas, e verdade se diga que o sector têxtil da UE teve 10 anos de transição, mas presentemente, a viver em economia globalizada, a UE procura limitar as importações e prolongar o período de transformação de forma indirecta.

De facto poderá à primeira vista aceitar-se que a EU apoiando-se na protecção, não lhe será possível reforçar o fraco sector têxtil europeu, uma vez que só por meio de esforços, reajustes e cooperação se poderá dar um impulso e incentivo ao sector. A investigação da UE pretende determinar as causas e efeitos do aumento das exportações chinesas para a UE, uma vez que aparentemente, as importações desses produtos aumentaram entre 51% e 534% durante os três primeiros meses deste ano em relação a 2004. A China realça, que as importações de têxtil europeu à China aumentaram 28%, o que demonstra um aumento generalizado do volume de trocas desse tipo de produto, em que a roupa chinesa sempre sofreu limitações e seria natural e razoável que, ao serem eliminadas as quotas, o crescimento subisse de forma rápida a curto prazo. Afirma-se que a UE não lhe assiste razão ao iniciar a investigação, com apenas dados de dois ou três meses, pelo que a indústria chinesa pediu ao seu governo que liderasse as negociações com a UE de forma a encontrar uma solução.

A China aplicou, como se disse no começo do ano, uma tarifa média de 1,3% sobre as exportações de têxteis no sentido de travar o enorme volume e evitar que a UE impusesse quotas unilaterais às vendas chinesas. Todavia parece-nos que qualquer imposição de quotas ou tarifas afectará de igual forma os produtores chineses e europeus, o que está a provocar algumas reacções de fabricantes europeus na China.

A maioria de fabricantes de roupa europeus na China não está estabelecida com fábrica própria, mas compra sob encomenda. É uma indústria muito internacionalizada, que igualmente importa da China, da Índia ou do Médio Oriente. A UE afirma que deve ser a China a limitar, voluntariamente as suas exportações se quiser evitar a imposição de quotas, mas acreditamos que a UE também poderia ser obrigada a limitar as licenças de importação da China que concede às empresas europeias que compram nesse mercado. A indústria chinesa pediu à UE que leve em conta a diversidade entre as duas partes, já que a EU é mais poderosa quer tecnicamente, quer no tipo de máquinas usadas, qualidade das tintas, marcas, desenho e marketing, e a China, em execução da produção e mão-de-obra barata.

Jorge Rodrigues Simão, in “HojeMacau”, 19.05.2005
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